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Mais de dois meses de trabalho extenuante e desafios inusitados marcaram a vida dos gestores municipais de Saúde no enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus.
Desde os primeiros dias da pandemia no estado de São Paulo, os gestores municipais elaboraram Planos de Contingência, criaram Centros Operacionais de Emergência (COE), deram subsídios aos prefeitos para Decretos de Isolamento Social, passaram a lidar diariamente com a mídia com questionamentos, muitos sem resposta, uma vez tratar-se de um vírus novo, altamente transmissível e uma doença com características pouca conhecidas, que iniciou na China, mas já vinha acometendo cidades da Europa, de forma avassaladora. Diante deste cenário, os gestores tiveram de fazer mudanças na rede assistencial em pouquíssimo tempo, para dar conta de um cenário epidemiológico caracterizado com aumento de casos e de óbitos, a cada dia.
Com o surgimento dos primeiros casos de sintomáticos respiratórios houve a orientação para a coleta de exames laboratoriais para confirmação da infecção pelo Novo Coronavirus, sendo o RT-PCR – o chamado padrão ouro para confirmação da COVID-19, que detecta o vírus na secreção das narinas e orofaringe. Os exames são realizados pelo Instituto Adolfo Lutz (IAL), da Secretaria de Estado da Saúde (SES).
Logo no início da pandemia os gestores perceberam que o IAL não tinha estrutura para responder com agilidade necessária ao aumento da demanda, e os exames começaram a demorar de 15 a 20 dias, tempo incompatível com as necessidades de quem estava na ponta do sistema, chegando a acumular 17 mil exames parados no IAL, incluindo amostras de pacientes que já tinham falecido.
Com o crescimento do número de suspeitos e a falta de confirmação diagnóstica, a mídia nacional e local começou a questionar os dados, e muitos gestores foram acusados de estarem ‘escondendo dados’.
Essa situação perdurou por quase dois meses, e a rede do IAL só conseguiu normalizar os prazos de resultados dos exames de PCR na segunda quinzena de abril, quando o prazo de realização e resultado dos exames passou a ser de 48 a 72 horas.
Nesta mesma época parcela importante de trabalhadores da saúde começaram a apresentar sintomas da doença e com o atraso nos resultados laboratoriais a única alternativa era afastá-los pelo período de 15 dias, para que pudessem se cuidar, e também evitar a disseminação da doença. Por conta disto, grande quantidade de trabalhadores da saúde saiu dos postos de trabalho, com forte impacto nos serviços de saúde.
Nesse período, a questão dos chamados Testes Rápidos entrou na pauta como uma das medidas para aumentar a confirmação de casos. Porém, embora o ministério da Saúde (MS) informasse diariamente nas coletivas dadas à imprensa sobre aquisição pelo Brasil de milhões de testes, como também da produção nacional, os gestores não receberam qualquer apoio do MS ou da SES para testar sintomáticos respiratórios, durante os meses de março e abril.
Somente no dia 30 de abril os Testes Rápidos começaram a ser entregues para os municípios da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), e a expectativa é que os demais 606 municípios do estado recebam os Testes na primeira semana de maio. Isso porque o ministério iniciou a entrega dos Testes Rápidos na segunda quinzena de abril para o estado de São Paulo, e a SES não conseguiu agilizar a entrega das duas primeiras cotas, só iniciando a entrega a partir da pactuação bipartite na CIB de abril. O quantitativo previsto para São Paulo é de um milhão de Testes, destinados aos profissionais da saúde, da segurança pública e idosos institucionalizados ou de grupo de risco. A orientação do MS é de utilizar os testes para sintomáticos respiratórios, e no caso de profissionais de saúde também para os comunicantes.
Muitos gestores municipais, diante da demora nos resultados do PCR no IAL e da falta de Testes Rápidos da SES ou do MS, se viram obrigados a comprar Testes Rápidos para atender a necessidade de realização de algum tipo de confirmação laboratorial da infecção, mesmo sabendo das limitações do Teste Rápido.
Nessa ocasião, o COSEMS/SP produziu a Nota Técnica nº 05/2020 – Métodos laboratoriais para diagnóstico da COVID-19 (28/03/ 2020), com objetivo de subsidiar os gestores municipais na utilização dos Testes Rápidos.
Outro grande problema dos gestores municipais foi a questão dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI), essenciais para os trabalhadores da saúde diante de uma infecção com altíssima transmissibilidade.
Com a chegada da epidemia os EPI simplesmente desapareceram do mercado, e os que existiam para compra eram oferecidos a preços exorbitantes. Neste aspecto, os gestores municipais também não tiveram apoio do MS, nem da SES, nos dois primeiros meses da epidemia. Somente no início de abril, o MS fez uma entrega de EPI (luvas de procedimentos, máscaras cirúrgicas, aventais, entre outros), para o estado de São Paulo. E deste quantitativo, a SES repassou para os municípios cerca de 10% do que foi entregue pelo MS, na segunda quinzena de abril. A expectativa é que na primeira semana de maio a SES faça uma nova entrega de EPI para os municípios. Durante todo esse período os gestores municipais estão enfrentando dificuldades enorme na aquisição dos EPI.
Outro problema sério enfrentado pelos gestores municipais refere-se as ações de vigilância epidemiológica dos casos suspeitos e confirmados de COVID 19, especificamente no tocante à notificação nos sistemas de informação do ministério da Saúde, cujos dados são consolidados pelo Centro de Vigilância Epidemiológico, da SES.
Os problemas começaram a aparecer quando os dados obtidos pelos gestores municipais a partir dos registros nos sistemas e SUS VE e SIVEP- Gripe não eram os mesmos dados divulgados pelo Governo do Estado nas coletivas para a imprensa.
Como é do conhecimento de todos é obrigatória a notificação dos casos de Síndrome Gripal/SG e os de Síndrome Respiratória Aguda Grave/SRAG hospitalizado, ou óbito por SRAG.
Os profissionais e instituições de saúde do setor público ou privado estão obrigados a notificar, em prazo de 24 horas, a partir da suspeita inicial do caso ou óbito. Os casos de SG devem ser notificados por meio do sistema e-SUS VE, sistema que foi implantado em plena epidemia, sem que houvesse capacitação dos profissionais que operam esse sistema.
Já os casos de SRAG hospitalizados devem ser notificados no Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe). As SG atendidas nas Unidades de Vigilância Sentinela de Síndrome Gripal também são notificadas no SIVEP Gripe, como também os óbitos suspeitos, independente de internação, devem ser notificados no SIVEP-Gripe.
Os LACEN registram os resultados dos exames processados no GAL (Sistema Gerenciador de Ambiente Laboratorial) e os municípios devem transportar os dados para o SVE GRIPE descartando ou confirmando casos. Assim, o IAL registra no GAL os resultados dos exames R T-PCR de casos de SRAG, e SG das Unidades Sentinelas.
Tendo em vista a necessidade de operar vários sistemas e atrasos dos resultados pelo IAL, muitos gestores municipais se viram obrigados a acompanhar os casos suspeitos e confirmados e óbitos, através de consolidados retirados das notificações da vigilância local.
Há também municípios que contrataram laboratórios habilitados pelo IAL para contornar o problema da demora dos resultados.
E o CVE, que trabalha com o conjunto de dados de todo o estado, necessita de maior tempo para consolidar os dados. Esta defasagem, aliada ao problema da demora de confirmação de casos de coronavirus pelo IAL, provocou a diferença de dados entre o estado e municípios.
Outro problema enfrentado pelos gestores municipais foi a morosidade da SES na construção da Grade de Urgência e Emergência para atendimento da COVID-19 nas Regiões de Saúde, inclusive na RMSP, considerada epicentro da epidemia. Estamos na primeira semana de maio, e as referências de leitos hospitalares e de UTI ainda não estão claras em várias regiões. Evidentemente que a Grade é flexível e deve ser modificada em decorrência de mudanças no cenário epidemiológico da pandemia nas diferentes regiões do estado. Mas é fundamental que o desenho seja estabelecido mediante pactuação em CIR e com a anuência dos grandes prestadores. A Grade precisa estar disponível não somente para as Centrais de Regulação (CROSS e outras) mas para todos os gestores e gerentes dos serviços, particularmente para as unidades da Rede de Urgência e Emergência (RUE). Ainda que haja necessidade de adequações semanais ou quinzenais, a Grade precisa ser definida rapidamente.
Apesar de todas as dificuldades nas relações com a SES, na inexistência de apoio efetivo do MS num momento de calamidade pública como o que estamos vivendo, os gestores municipais estão desenvolvendo estratégias inovadoras de gestão do cuidado na AB, de articulação intersetorial, de comunicação, entre outras. Estas iniciativas certamente vão constituir-se em aprendizado para gestores e trabalhadores do SUS no “novo normal’ pós pandemia.