Gilson Carvalho: As falácias da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo sobre a venda de leitos e serviços públicos

Gilson Carvalho: As falácias da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo  sobre a venda de leitos e serviços públicos

"A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo informa que ainda não foi notificada sobre a decisão do Tribunal de Justiça. Cabe ressaltar, entretanto, que não houve julgamento do mérito, e sim de recurso interposto pelo Estado contra a liminar.

A finalidade da lei é permitir que os hospitais estaduais gerenciados por Organizações Sociais (entidades sem fins lucrativos) possam ser ressarcidos pela assistência médica que prestem a pacientes beneficiários de planos de saúde. Este atendimento já acontece hoje, mas até agora não havia possibilidade legal de cobrança, o que acaba onerando o caixa do SUS (Sistema Único de Saúde) em cerca de R$ 500 milhões por ano.

Sem esta possibilidade de cobrança de ressarcimento, permanecerá o quadro de injusto e de indevido benefício às operadoras de planos de saúde, que recebem a mensalidade dos seus clientes mas não têm nenhum desembolso quando eles são atendidos em hospitais públicos.
Os hospitais estaduais gerenciados por OSS ficarão proibidos de cobrarem dos planos de saúde, que usam as unidades públicas sem pagarem nada por isso.

É fundamental esclarecer que a regulamentação da lei estadual já proíbe expressamente qualquer reserva de leitos ou preferência a pacientes de planos de saúde, e garante idêntica qualidade a todos os pacientes na prestação de serviços e disponibilização de equipamentos, acomodações e insumos. É errado, portanto, falar em "venda de leitos", "reserva de leitos" ou "dupla porta". Isso não ocorrerá.

Em São Paulo a excelência e a qualidade de hospitais estaduais gerenciados por OSS vêm atraindo cada vez mais beneficiários de planos de saúde, que são atendidos gratuitamente nessas unidades públicas. Cerca de 20% dos pacientes desses hospitais possuem algum tipo de plano privado de saúde. Desta forma, a conta vai para o SUS, retirando recursos que deveriam ser destinados aos que dependem exclusivamente da rede pública. Trata-se, portanto, de uma distorção, que beneficia somente as empresas de planos de saúde.

A Secretaria entende que a nova lei corrige esta distorção, criando fonte complementar de financiamento para hospitais do governo, e também promove justiça social, ao garantir que os recursos do SUS serão aplicados na assistência dos pacientes que dependem, de fato, da rede pública".

Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.
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Gilson Carvalho
Acima está o inteiro teor da nota da Secretaria Estadual de Saúde que nasceu eivada de falácias. Lamento muito este texto, como ex servidor concursado e de carreira da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo pois, a SES tem excelentes técnicos juristas e peritos que entendem tudo da legislação pública, do estado e do SUS. Jamais poderia a direção da Secretaria Estadual de Saúde ter oferecido este texto como resposta repleta de erros crassos. Falácia de cima a baixo.
Vamos analisar item por item.

* "A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo informa que ainda não foi notificada sobre a decisão do Tribunal de Justiça. Cabe ressaltar, entretanto, que não houve julgamento do mérito, e sim de recurso interposto pelo Estado contra a liminar.

A finalidade da lei é permitir que os hospitais estaduais gerenciados por Organizações Sociais (entidades sem fins lucrativos) possam ser ressarcidos pela assistência médica que prestem a pacientes beneficiários de planos de saúde. Este atendimento já acontece hoje, mas até agora não havia possibilidade legal de cobrança, o que acaba onerando o caixa do SUS (Sistema Único de Saúde) em cerca de R$ 500 milhões por ano".

Gc:. Reduzir a discussão e a argumentação de defesa apenas aos planos é omitir o inteiro teor da autorização legal pleiteada pela Secretaria Estadual de Saúde e concedida pelos parlamentares de apoio ao Governo Estadual. Temos que ser claros e não usar de subterfúgios. A autorização foi de que, além da cobrança ilegal dos planos (a legal é feita pelo Governo Federal) de planos pudesse o estado, através da OS, também fazer a abominável cobrança dos ditos “privados” ou “particulares puros”. É quando se discute a cobrança de privados puros que fica mais odioso o fato e mais escancarada a inconstitucionalidade.

Falar de ressarcimento relativo a planos e seguros de saúde diretamente pelo Estado de São Paulo ou suas Organizações Sociais seria uma ilegalidade. Quem pode regular este tema é o Governo Federal e já o fez por lei. A ANS comanda este processo de ressarcimento faz anos. Nem sempre foi ágil o suficiente por cobrar o ressarcimento, mas, os planos também usaram dos recursos ao Judiciário para não pagarem. Se o Estado de São Paulo, por autodeterminação de seu governo, apoiado pelo legislativo, cria o ressarcimento já existente no federal, os planos e seguros de saúde pagarão duas vezes? Ao Ministério da Saúde e à Secretaria Estadual de Saúde? O Ministério não pode deixar de cobrar, nem fazer acordos deixando esta obrigação com estados, pois, estaria descumprindo sua lei que, hierarquicamente, é maior que a estadual. O Ministério da Saúde, obrigatório detentor do cadastro dos beneficiários de planos pode identificá-los independente da declaração dos planos e dos beneficiários. Para reforçar esta autoridade o MS/ANS começa a registrar no cartão do SUS, 31 mi de usuários dos planos.

Quem pode regular este tema é o Governo Federal e já o fez por lei. Tem outra questão: o Hospital das Clínicas, seus Institutos e as Organizações Sociais já estão sendo remuneradas por procedimento ou por valor financeiro de teto, com recursos do SUS. Como fica o duplo pagamento do ressarcimento federal e estadual? Ou, quando receber do plano, estes hospitais devolverão recursos ao SUS? Mais: quem será ressarcido? Os hospitais estaduais ou as Organizações Sociais? Qual ente vai receber os recursos?

Não se pode falar que os privados puros estejam fazendo ressarcimento pois desembolsam para ser atendidos, aquilo a que já teriam direito por pagarem impostos. Que ressarcimento é este? Duplo pagamento? É evidente que trazendo à discussão pública apenas a questão dos planos estão omitindo o criminoso de cobrar duas vezes do cliente privado puro. Vale lembrar que a palavra gratuito que só tinha na legislação de São Paulo e que foi suprimida para permitir estas cobranças, agora, desde 13 de janeiro de 2012 está inscrita na LC 141 válida e obrigatória para todo país.

Como a SES-SP pretende descumprir a lei nacional? Terão o aval do judiciário nesta ilegalidade?

*"Sem esta possibilidade de cobrança de ressarcimento, permanecerá o quadro de injusto e de indevido benefício às operadoras de planos de saúde, que recebem a mensalidade dos seus clientes mas não têm nenhum desembolso quando eles são atendidos em hospitais públicos".

Gc:. Mais uma vez: intrigante como puxam só pelos planos e pulam que vão também cobrar de privados. Realmente seria de extrema injustiça que os planos tivessem lucro sem matéria. Para que isto não ocorresse foi determinado o ressarcimento ao público dos recursos devidos ao atendimento e que pelo qual receberam, sem prestar o serviço. O Congresso Nacional já decidiu isto e colocou nas mãos do Ministério da Saúde – Agência Nacional de Saúde Suplementar, a incumbência do ressarcimento. Dentro do SUS, agora, nem Estados e nem Municípios podem tomar a frente e fazer suas leis, grande parte delas ferindo legislação federal ou mesmo estadual.

*"Os hospitais estaduais gerenciados por OSS ficarão proibidos de cobrarem dos planos de saúde, que usam as unidades públicas sem pagarem nada por isso".

Gc:. Claro que ficarão, mas o mais grave é que se receberem, o farão duplamente pois as Organizações Sociais já receberam no contrato global feito com a Secretaria de Saúde. Pergunto: esta proposta foi para que as organizações Sociais recebessem mais dinheiro pelos serviços prestados? Recebessem em dobro? Do contrato, dos planos e ainda dos privados puros? Mais lucro, para organizações não lucrativas, como qualquer privado lucrativo?

Acima está que, quem deve fazer a cobrança e corrigir esta distorção é o Ministério da Saúde/ANS e não cada esfera ou equipamento de Saúde. Afinal o Sistema Público de Saúde é ou não um Sistema Único de Saúde com normas nacionais, estaduais e municipais? Constitucionalmente tem normatizações que são de competência nacional e outras comuns ao Governo Federal, Estadual ou Municipal. Outras só dos estaduais e outras só dos municipais

* "É fundamental esclarecer que a regulamentação da lei estadual já proíbe expressamente qualquer reserva de leitos ou preferência a pacientes de planos de saúde, e garante idêntica qualidade a todos os pacientes na prestação de serviços e disponibilização de equipamentos, acomodações e insumos. É errado, portanto, falar em "venda de leitos", "reserva de leitos" ou "dupla porta". Isso não ocorrerá".

Gc:. Acho que tentam enganar a opinião pública , dizendo que a lei 1131 “proíbe expressamente qualquer reserva de leitos ou preferência a pacientes de planos de saúde”. A dupla porta já é praticada há décadas no complexo HC, INCOR (ainda que só autorizada por lei recente, ainda não regulada!) vai na direção oposta: reserva leitos e dá preferência aos planos e particulares. Sabe-se que são praticadas várias formas obliquas e de ética duvidosa de quebrar a fila única. Por que acreditar que seria diferente nos demais hospitais? Veja-se o exemplo do ICESP, também pertencente ao complexo HC e que seria o primeiro beneficiado da lei. O que pretendem ali é implantar o modelo INCOR de dupla porta, com respaldo legal.

Como serão classificados os privados para dizer: este vai pelo SUS e este vai pagar? Se os privados já podem ser, como cidadãos, atendidos pelo SUS sem desembolso no ato (apenas pelos impostos) o que os levaria a pagar uma segunda vez  pelo mesmo atendimento? Imaginem o insólito das pessoas na fila: você pode ou não pode pagar? Se puder paga e se não puder nada paga. Qual será a linha de corte? Qual critério? Quais pacientes privados pagariam por fora se souberem que entrarão sequencialmente pela fila, sem nenhum privilégio?
Furariam a fila no principal e/ou condicionantes do principal (exames para cirurgias e internações)? Ficariam em acomodações especiais? Dietas diferenciadas? Possibilidade de acompanhantes além das legais hoje já autorizadas? Visitas a qualquer horário? Os profissionais de saúde darão (ou prometerão dar) algum atendimento especial? Mais visitas profissionais ou mais tempo de duração?

Eles teriam sido ludibriados? são ingênuos ou sofreriam de idiotia? Como pagar se poderiam receber tudo igualzinho, sem pagar? Mistério misterioso que desafiaria os mais graduados e experientes psicólogos, sociólogos e antropólogos e dezenas de outros!

O pagamento feito ao Estado ou à Organização Social incluirá honorários profissionais? Estes serão pagos por fora ou entrarão no caixa da instituição ou O.S.? Estes pagarão aos profissionais: como autônomos com os devidos pagamentos de encargos sociais e imposto de renda? Ou órgãos públicos ou seus prepostos fecharão os olhos? Permitirão, em instituições públicas, o caixa dois da cobrança por fora, procedimento ilegal e antiético condenado pelo CFM? 

Se os profissionais receberem por fora (CPF) , por atendimento a planos e privados estão sendo remunerados por hora extra ou por trabalho no mesmo horário em que já são remunerados como servidores públicos do Estado? Ou funcionários das O.S.? Nos contratos constariam X de salários e mais tudo que receberem por fora no caixa dois? Duplo pagamento.

Sobre a afirmação de que será garantida “idêntica qualidade” no atendimento aos usuários de SUS e de planos/particulares, não passa de uma “pegadinha” . Depois de atendido o cidadão, a qualidade pode até ser a mesma, já que o equipamento e a equipe é a mesma. O problema é a discriminação no acesso , no agendamento, na resolutividade, na hotelaria e na frequência e duração da atenção.

*"Em São Paulo a excelência e a qualidade de hospitais estaduais gerenciados por OSS vêm atraindo cada vez mais beneficiários de planos de saúde, que são atendidos gratuitamente nessas unidades públicas. Cerca de 20% dos pacientes desses hospitais possuem algum tipo de plano privado de saúde. Desta forma, a conta vai para o SUS, retirando recursos que deveriam ser destinados aos que dependem exclusivamente da rede pública. Trata-se, portanto, de uma distorção, que beneficia somente as empresas de planos de saúde".

Gc:. Não se pode tirar de foco o essencial e argumentar sobre aquilo que não é objeto de discussão, nem de qualquer acusação. É indiscutível a boa qualidade de serviços prestados por vários hospitais estaduais de São Paulo entregues ou não às Organizações Sociais. Não há quem negue esta qualidade. Querer transferir o foco como se a acusação fosse contra os hospitais e seus funcionários é chantagem emocional que já beira a baixaria. Já usamos os contra-argumentos, mas aqui a falácia é gritante. Vamos às contas: se eu libero 25% dos serviços públicos de saúde e os destino oficialmente aos pacientes de planos ou privados puros eu estou, insofismavelmente, subtraindo serviços dos que dependem exclusivamente da rede pública. Mas, dirão, eles vão pagar e com este dinheiro que tiramos dois ricos, vamos ajudar a montar os serviços dos pobres. Seria assim? Na verdade subtraio, tiro efetivamente sob o argumento que vou aumentar!!! Que lógica matemática é esta? Estão menosprezando a sínteses de nossos dois neurônios?

*"A Secretaria entende que a nova lei corrige esta distorção, criando fonte complementar de financiamento para hospitais do governo, e também promove justiça social, ao garantir que os recursos do SUS serão aplicados na assistência dos pacientes que dependem, de fato, da rede pública. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo".

Gc:. Mais falácias e agora apelando mais uma vez pela emoção. Vamos receber dos planos para ajudar os "pobrinhos", dizem os defensores da dupla porta! Não sou, nem poderia ser, contra receber dos planos e seguros. Sou pelo estado de direito e isto já está regulamentado em lei nacional. É necessário e legal receber para que os planos não tenham lucro sem matéria. Sou contra: reserva de leitos para os privados puros e para os planos (25%), a fila dupla numa dupla porta. Todos os demais falaciosos argumentos dos que defendem a privatização do público, não mereceriam resposta pois estariam invalidados por estas premissas.