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Por Mariana Melo, assessora técnica do COSEMS/SP
Confira a análise da execução orçamentária em relação à Assistência Farmacêutica no estado de São de São Paulo e seus impactos diretos no abastecimento de medicamentos do componente básico e especializado
Contexto Geral
O nível de abastecimento de medicamentos é fortemente afetado pela dinâmica da execução orçamentária, dado o grande volume de itens adquiridos pela forma de Ata de Registro de Preços. Isto porque, esta forma de aquisição não é precedida de um empenho único estimativo anual (como nos contratos e convênios), mas sim de empenhos pontuais. Assim, a restrição orçamentária e financeira posterga o empenhamento, e consequentemente todas as fases da despesa pública: o pedido de fornecimento de medicamentos, a entrega, a liquidação e o pagamento. Este atraso na cadeia das fases da despesa pública faz com que os itens não sejam entregues em tempo e quantidades necessárias ao planejado nas Programações Anuais de Saúde.
No entanto, há outro reflexo igualmente importante e que retroalimenta este cenário de desabastecimento: o registro em restos a pagar (despesas empenhadas não pagas). Os Restos a Pagar prejudicam a gestão orçamentária financeira do próximo exercício, contribuindo para o atraso das fases da despesa pública, postergando o empenhamento, e consequentemente a entrega dos medicamentos. Para se ter uma ideia da magnitude, no exercício de 2019, quase um terço do pagamento de restos a pagar da Saúde foi da área da Assistência Farmacêutica.
No caso da Secretaria Estadual de Saúde, além das Atas de Registro há produção direta pela Fundação para o Remédio Popular (FURP), que produz itens dos diferentes programas estaduais.
O Planejamento Orçamentário 2016–2019 (Plano Plurianual) se estrutura em 13 Programas Orçamentários compostos por uma série de ações orçamentárias. Há um único programa que concentra mais de 80% do recurso total do Orçamento da Saúde, o Programa 930 – Atendimento Descentralizado no SUS. Tal concentração prejudica análises desagregadas.
No que tange a Assistência Farmacêutica, esta dificuldade de análise é constante em todos os períodos analisados desde 2012. Os recursos da área estão dispersos entre diferentes ações orçamentárias, com exceção do componente Especializado que concentra os recursos em uma ação orçamentária (6117). Desta forma, a única possibilidade de analisar o componente básico é fazer o recorte para os dados agregados por subfunção. E, já para o componente especializado é possível acompanhar o desempenho da execução da dotação específica (ação 6117).
Componente Especializado
Número médio mensal de apresentações farmacêuticas e insumos que faltaram nas farmácias do CEAF (parcial ou totalmente), no período de 08/2018 a 01/2020, de responsabilidade da SES/SP e do MS. O CEAF tem cerca de 280 medicamentos disponibilizados. Essa tabela reflete uma instabilidade na logística de aquisição e distribuição dos medicamentos para os municípios. Em janeiro de 2020 a média de problemas relatados é em 6,4 % de todos os itens adquiridos pela Secretaria Estadual e Ministério da Saúde. Não foi analisado o medicamento, consumo e agravo relacionado.
O desabastecimento dos itens do Componente Especializado, identificado no período (Tabela 1), relaciona-se à execução tardia dos recursos previstos na Ação Orçamentária do Componente Especializado (ação 6117) como demonstra a Tabela 2. Como podemos observar acima, segundo parâmetros estabelecido pela Metodologia de Análise do Desempenho da Execução Orçamentária desenvolvida e utilizada pelo Conselho Nacional de Saúde (Publicada na Domingueira da Saúde nº 23/2018 – IDISA), os primeiros quadrimestres dos dois exercícios apresentam níveis baixíssimos de execução, classificados como “Inaceitáveis” pela metodologia referida, sendo respectivamente 6% e 10%.
Os segundos quadrimestres apresentam desempenho melhor, apesar de ainda classificados como “inaceitáveis”. No entanto, os terceiros quadrimestres de cada exercício demonstram uma elevação significativa do nível de execução, sendo então classificados como adequado e regular, respectivamente.
Este fenômeno se relaciona a um possível cenário de restrição orçamentária e financeira: os compromissos de 2018 (provavelmente, tal como os de 2017 não compreendidos na análise), foram assumidos no final do exercício (liquidados) alocando a pressão financeira das despesas para o próximo exercício. Tendo em vista o significativo volume de restos a pagar inscritos na área como exposto acima, os empenhamentos do exercício de 2019 demoraram mais que o usual para ocorrer, o que prejudicou a execução orçamentária do respectivo exercício, provocando o desabastecimento verificado ao longo do curso do ano de 2019. Infelizmente, os dados demonstram que o exercício de 2020 sofrerá os mesmos reflexos.
Por fim, é importante frisar que o COSEMS/SP como membro atuante do Conselho Estadual de Saúde contribuiu para elaboração de uma Recomendação no bojo da ação da Comissão de Políticas de Saúde, Grupo de Trabalho da Assistência Farmacêutica, que determinou a antecipação da última cota orçamentária quadrimestral para área para o mês de julho/2019 (cota prevista para fim de setembro/19) e efetivação do incremento orçamentário de 25% para a Coordenação da Assistência Farmacêutica (incremento projetado pela Secretaria Estadual para a CAF para 2019, no entanto não foi formalizado na Lei Orçamentária Anual até aquele momento). Apesar do incremento ter sido efetivado, a antecipação da cota orçamentária não foi realizada como definido na Recomendação. E o cenário de desabastecimento e perfil de desempenho da execução orçamentária se repetiu em mais um exercício com perspectivas de prejudicar o abastecimento em 2020.
Componente Básico
O Dose Certa tem cerca de 61 medicamentos disponibilizados. Essa tabela reflete uma instabilidade na logística de aquisição e distribuição dos medicamentos para os municípios. Em janeiro de 2020 a média de problemas relatados é em 47,5 % de todos os itens adquiridos pela Secretaria Estadual, praticamente a mesma situação enfrentada no início de 2019. Não foi analisado o medicamento, consumo e agravo relacionado.
A correlação do desabastecimento do Programa dose Certa e a dinâmica da execução orçamentária pode ser demonstrada pela análise da Subfunção Contábil mais afeta ao nível de atenção. Os dados disponibilizados no Sistema de Informações Gerenciais da Execução Orçamentária do Governo de Estado (SIGEO) e Sistema de Orçamento Públicos de Saúde (SIOPS) demonstram que de 2012 a 2019, a Subfunção contábil “Suporte Profilático e Terapêutico (303)” foi executada em média 80%. Isto significa que 20% dos recursos programados para a Subfunção não foram executados, o que prejudica inclusive a entrega de medicamentos. Os anos de 2015 e 2017 se destacam por apresentarem os menores percentuais de execução da Assistência Farmacêutica, com 71% e 72,5% respectivamente executado.
A análise do desabastecimento do Programa Dose Certa evidencia que a forma como a SES executa seu orçamento é uma das principais causas da falta de medicamentos nos municípios. Como observado na Tabela – 3 acima, o nível de desabastecimento dos meses de janeiro de 2019 e 2020 são semelhantes, visto que janeiro é o mês mais suscetível à interferência da dinâmica da execução orçamentária, pois o empenhamento tardio de itens reflete-se na ausência de estoque regulador apropriado para o abastecimento de início de ano contábil. Ademais, como a dinâmica da SES/SP é a liberação de recursos orçamentários para empenhamento à CAF três vezes ao ano, este constrangimento se agrava também, pelo menos, em três momentos. Observe na tabela abaixo que os meses que antecedem esta liberação refletem este fato: janeiro/2019 – 26 itens com irregularidade no abastecimento; maio/2019 – 32 itens com irregularidades no abastecimento; novembro/2019 – 25 itens com irregularidades no abastecimento.