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Por Enio Servilha Duarte, médico sanitarista, ex-secretário municipal de Saúde, ex-presidente do COSEMS/SP e ex-secretário executivo do CONASEMS.
Diante da proliferação do termo Atenção Primária à Saúde nas propostas e debates da saúde pública nacional, torna-se indispensável traçar algumas considerações sobre os motivos pelos quais optamos pelo uso do termo Atenção Básica no Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.
No começo da década de 70, nós, sanitaristas envolvidos na elaboração de uma nova política de saúde para o país, observamos que o termo Atenção Primária gerava resistência na população, que dizia: para os “ricos” é medicina particular, plano de saúde – que estava começando – e para nós, esta tal de Atenção Primária.
Procurando entender melhor o porquê desta resistência descobrimos que esta perspectiva de identificar um “serviço para rico” e um “serviço para pobre” vinha da Educação. Isso porque quando se implantou o Curso Primário de Educação nos Grupos Escolares, no início da década de 50, houve um grande aumento na educação infantil, mas que se restringiu a esta fase inicial do Sistema de Educação. O ensino médio – Ginásio e Colegial – continuou restrito aos “ricos”, nas escolas privadas, principalmente religiosas, ou públicas nos grandes municípios. Eu mesmo, para ser admitido no Ginásio, fui submetido a um difícil exame de admissão, que obrigava até a preparação em cursinhos privados. Lembro que esse exame foi mais difícil do que o que enfrentei para ser admitido na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), oito anos depois.
Nossa sábia população já compreendia que aqueles que ficavam restritos ao Ensino Primário – a maioria – eram os mesmos que teriam restringidos os acessos às melhores oportunidades de empregos e de qualidade de vida de uma forma geral. A população já intuía a definição deslindada no Aurélio: primário 8.Br. Limitado, rudimentar, acanhado, estreito, primitivo. 9.Bras. Sem consistência ou grandeza, mesquinho, superficial. O povo quando quer desqualificar alguém sentencia: é primário.
Por este motivo, os pioneiros do SUS, sugeriram a Atenção Básica, que foi aceita pela população e incorporada pelos dirigentes e trabalhadores do SUS. Olha como está, de maneira bem simples, no Aurélio: básico. 3. Fundamental, principal, essencial. Estava resolvido, com apenas algumas poucas resistências da Academia, porque o termo Atenção Primária é tradução do inglês primary health, e a resistência à Atenção Básica era para não contrariar os colonizadores, principalmente os ingleses e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), geralmente longe das realidades locais.
Por falar nisto, não está na hora da OPAS sair de Washington e vir para a América Latina – sugiro Costa Rica, com uma Democracia muito estável, localizado na América Central e muito perto da América do Sul – onde estão os grandes problemas e necessidades de apoio aos Sistemas Nacionais de Saúde.
Em função de todas estas considerações não vejo nenhum motivo nesta proposta de alguns setores do Ministério da Saúde, principalmente diante de todos os problemas que temos que enfrentar na consolidação da Atenção Básica, fortalecendo o seu financiamento e a pactuação regional tripartite, parece pouco proveitoso, para não dizer primário, ressuscitar um termo morto e enterrado, que em nada contribui para o avanço do SUS. Deixemos de ser colonizados!!
O Ministro da Saúde foi um ótimo Secretário Municipal de Saúde de Campo Grande, dando continuidade ao excelente trabalho da Beatriz Dobashi, e um batalhador pelo avanço da Atenção Básica no município, região e Estado.
A Educação, que deu início à utilização de “Primário” também mudou para Educação Básica, que está na Constituição, nos artigos 210 e 211, fazendo parte do Ensino Fundamental.
Caros Gestores Municipais, sal do SUS, como está no Evangelho, não concordem. Defendam e reivindiquem o que está na Constituição, como responsabilidade do município (Art. 30, item VII): prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população. Como a execução é principalmente dos municípios, precisamos cobrar do Governo Federal e dos Estados o que significa realmente os apoios técnico e financeiro. Precisamos ficar alerta também com a proposta de diminuir o número de municípios. Isto é muito grave para o SUS.
Quando achamos que é só Terra Plana, aparecem outras “ideias” esdrúxulas como esta da volta ao “Primário”.