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O COSEMS/SP recebeu com apreensão a publicação do Decreto Federal nº 10.530, de 27/10/2020, pois entendemos que a proposta contida no mesmo contraria não só princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), mas também a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), estabelecida na Portaria nº 2.436, de 17/09/2017.
O primeiro aspecto que nos chamou atenção é um Decreto do Governo Federal que não foi discutido nas instâncias do SUS. Segundo a Portaria nº 2.436/2017, a “Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) é resultado da experiência acumulada por um conjunto de atores envolvidos historicamente com o desenvolvimento e a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS), como movimentos sociais, população, trabalhadores e gestores das três esferas de governo”.
Ou seja, é inadmissível qualquer estudo ou mudança na Atenção Básica (AB) que não seja conduzido de forma tripartite, com discussões ascendentes nas instâncias regionais (CIR) e bipartite (CIB). Por outro lado, há que se enfatizar que 100% das Unidades Básicas de Saúde (UBS) estão sob a gestão e responsabilidade dos municípios, que financiam cerca de 70% do custeio da AB, o que reforça a necessidade de participação das entidades representativas dos gestores municipais, Conselho de Secretários Municipais de Saúde (COSEMS) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), na formulação de propostas envolvendo a AB. Na história do SUS, as alterações da PNAB foram precedidas de ampla discussão, durante meses, envolvendo os gestores das três esferas de governo, trabalhadores e movimentos sociais, discussão com Conselhos de Saúde, contribuições da Academia, consulta pública, entre outros.
Outro aspecto do Decreto diz respeito a proposta de parceria com a iniciativa privada para a “construção, a modernização e a operação de Unidades Básica de Saúde”, o que afronta diretamente a essência do SUS e da PNAB, considerando que a AB não é um ponto de assistência à saúde, que poderia eventualmente ser gerenciado por um Plano de Saúde ou similar.
A AB é a base de sustentação da Rede de Atenção à Saúde, e “primeiro ponto de atenção e porta de entrada preferencial do sistema, que deve ordenar os fluxos e contrafluxos de pessoas, produtos e informações em todos os pontos de atenção à saúde.”
É inconcebível que essas atribuições da AB possam ser executadas pela iniciativa privada, visto que a AB está intrinsicamente articulada com o SUS no município e na região de saúde, é reguladora de fluxos para os serviços de referência de maior complexidade.
Ainda segundo a PNAB/2017, a AB deve “ incorporar as ações de Vigilância em Saúde – a qual constitui um processo contínuo e sistemático de coleta, consolidação, análise e disseminação de dados sobre eventos relacionados à saúde – além disso, visa o planejamento e a implementação de ações públicas para a proteção da saúde da população, a prevenção e o controle de riscos, agravos e doenças, bem como para a promoção da saúde”. Mais uma vez, a própria formulação da PNAB explicita com clareza a articulação com a Vigilância em Saúde, com a coleta de dados e produção de informações essenciais para o planejamento, monitoramento e avaliação do SUS, para a produção dos Indicadores de Saúde do Pacto Interfederativo, execução e monitoramento do Programa Nacional de Imunização (PNI), entre outros. É absolutamente impossível privatizar a AB sem desmontar a lógica de funcionamento do SUS, que vem sendo construída a duras penas há mais de três décadas pelos trabalhadores, gestores, academia, conselheiros de saúde, movimentos sociais e pela sociedade brasileira.
Se o Ministério da Saúde pretende elaborar “estudo para construção, a modernização e a operação de Unidades Básica de Saúde”, esses estudos devem ser conduzidos de forma tripartite, com apoio das Universidades, que tem conhecimento, metodologia, acúmulo de produção teórica sobre o SUS, muitas delas em parceria com gestores, trabalhadores, conselheiros e usuários do SUS. Há uma rica e fundamental produção teórica e científica sobre o SUS na academia que deve ser obrigatoriamente considerada A análise das informações do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ) e a articulação com as Universidades responsáveis pela avaliação externa do mesmo poderia ser um ponto de partida para detectar as necessidades de melhoria do acesso e da qualidade da AB, que como todos sabemos necessita mais recursos financeiros, apoio para informatização, programas robustos de formação dos trabalhadores e gestores através de processos de Educação Permanente, fortalecimento da Estratégia de Saúde da Família, de mais médicos, ampliação das equipes multiprofissionais nas UBS, melhores salários, entre outros.
Diante do exposto, o COSEMS/SP conclama os trabalhadores, gestores, academia, movimentos sociais e sociedade a se posicionarem contra o Decreto nº 10.350 e pelo fortalecimento da AB e do SUS.