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O COSEMS/SP consultou o Instituto de Direito Sanitário Aplicado (IDISA) a respeito do Projeto de Lei nº 435, de 2019, aprovado na Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador que publicou a Lei 17137/19.
A questão diz respeito à legalidade do provimento legislativo, em vista as normas que regem o SUS e as disciplinas a respeito do parto cesariano, com o Brasil sendo considerado seu campeão, ao arrepio de recomendações de organismos internacionais e das políticas de saúde nacionais.
O projeto visa garantir à parturiente a escolha de parto cesariano, em nome da autonomia da vontade, tendo o médico a liberdade de realizá-lo ou não, quando deverá encaminhar para outro profissional, caso não concorde com a opção da gestante.
O SUS tem regras de organização e funcionamento e se assenta em fundamentos constitucionais voltados para a proteção da saúde mediante medidas e escolhas que inibam os riscos de agravos à saúde das pessoas, de modo individual ou coletivo.
Em que pesem os argumentos trazidos pela deputada Janaína Paschoal, quanto à proteção da autonomia da vontade, não se pode entender que essa autonomia possa se sobrepor às situações em que a política pública do Ministério da Saúde (MS), fundada em bases e evidências científicas e recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), define outra medida como a mais segura terapeuticamente.
Os alarmantes números de cesarianas no Brasil levaram o MS a pactuar com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde medidas para sua contenção. As Secretarias de Saúde dos estados, Distrito Federal e municípios devem cumprir o regramento federal e orientar os profissionais da saúde a diminuir o número de cesarianas desnecessárias, em razão de seus riscos.
Há ainda a Lei nº 8.069, de 1990, alterada pela Lei nº 13.257, de 2016, que determina em seu § 8º, art. 8º, que: “A gestante tem direito a acompanhamento saudável durante toda a gestação e a parto natural cuidadoso, estabelecendo-se a aplicação de cesariana e outras intervenções cirúrgicas por motivos médicos”. Uma lei estadual não pode impor ao SUS supostos direitos do exercício da autonomia da vontade, quando esses direitos contrariam lei federal e as diretrizes terapêuticas definidas pelo MS.
O SUS, ao decidir que o parto normal deve ser a regra e o parto cesariano a exceção — Lei nº 8.069 e Portaria MS nº 306, de 2016 —, não pode ser contrariado por uma lei estadual, não ficando seus gestores obrigados a mudar sua política pública de contenção da epidemia de parto cesariano, definida nacionalmente, por lei estadual.
A opção da mulher pelo parto cesariano, quando não indicado terapeuticamente, não pode obrigar o SUS a realizá-lo por contrariar política nacional de saúde. Lei estadual não pode impor ônus financeiro ao SUS e tampouco o PL define as fontes orçamentárias estaduais para cobrir tais custos.
O SUS se pauta pela Relação Nacional de Ações e Serviços de Saúde (RENASES) e por diretrizes terapêuticas, de competência federal, nos termos da Lei Federal nº 12.406, de 2011, e Decreto 7.508, de 2011. Estados e municípios estão obrigados a cumprir as políticas de saúde editadas pela União, MS, em comum acordo com os demais entes federativos, a quem compete realizar transferências de recursos financeiros aos demais entes para o custeio das ações e serviços de saúde. Os recursos das transferências federais estão congelados aos níveis de 2016, em razão da Emenda Constitucional 95, não podendo ser aumentados por novas demandas, como seria o caso se o parto cesariano puder ser de livre escolha, e não por necessidade.
A Lei 17.137 está na contramão da política pública de saúde, dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, da RENASES, do princípio da prevenção de risco à saúde e das recomendações da OMS. Ainda ao se legislar sobre a autonomia da vontade, está adentrando matéria de direito civil, quando a competência é privativa da União.
As situações de violência obstétrica, mencionadas pela parlamentar com opção para o parto cesariano, devem ser punidas na forma da lei, não se devendo combater um erro com opções que possam pôr em risco a saúde das pessoas.
Por todo o exposto, entendemos que a referida Lei fere:
a) O princípio constitucional expresso no art. 196 da Constituição, que determina ser a saúde direito de todos e dever do Estado garantido mediante políticas públicas que evitem o risco do agravo à saúde;
b) A diretriz de organização do SUS de priorizar o atendimento preventivo (art. 198, II d CF);
c) A competência da União de expedir normas gerais sobre as políticas de saúde que informam o SUS (art. 24, XII da CF);
d) A Lei nº 8.080, de 1990, alterada pela Lei nº 12.401, de 2011, que dispõe sobre a necessidade de protocolos e diretrizes terapêuticas sobre os agravos à saúde ou doenças;
e) A Lei nº 8.069, de 1990, artigo 8º, § 8º, e a Portaria MS nº 306, de 2016, que as definem em relação ao parto cesariano.
Acesse o parecer completo no link: https://www.cosemssp.org.br/noticias/consulta-juridica-ao-idisa-a-respeito-do-projeto-de-lei-n-435-de-2019-aprovado-na-assembleia-legislativa-de-sao-paulo/